'Lua de Além-Mar' e 'Rio de Sonho e Tempo', resenhas de Joám Manuel Araújo
A reedição desses dois poemários pela AGAL, em 1991, inclui uma “Apresentação” da Professora Doutora Maria do Carmo Henríquez Salido · O livro que os reúne está à venda na loja online Imperdível, com descontos para sócias/os da AGAL
Terça, 08 Novembro 2011 09:44

Joám Manuel Araújo - Em 1991 a Associaçom Galega da Língua (AGAL) reeditou os dois primeiros livros de poesia de Ernesto Guerra da Cal (Ferrol, 1911-Lisboa, 1994), publicados inicialmente em Vigo em 1959 e em 1963 pela Galáxia: Lua de Além-Mar e Rio de Sonho e Tempo.
Nomes cimeiros das Letras Galegas e da crítica literária especializada internacional estudaram-nos e manifestaram-se sobre eles em trabalhos publicados nos EUA (Raymond Sayers, Josephine de Boer, Antônio Houaiss, William Myron Davis, Manuel Jato Macías, Emilio González López, Daniel Cortezón...), Portugal (Jacinto do Prado Coelho, Helena Cidade Moura, Manuel Rodrigues Lapa, António Losa, Maria Joaquina Nobre Júlio, Francisco José Velozo, Carlos Reis...), Brasil (Manuel Bandeira, Eduardo Portella, Euryalo Cannabrava, Antônio de Oliveira Coelho, Estella Glatt...), Itália (Giusepe Carlo Rosi), França (Eugenio Granell), Espanha (Francisco Carenas, Luiz da Costa Lima Filho, Concha Castroviejo, Ramón Piñeiro, Eduardo Blanco Amor, Isaac Alonso Estravís...), Porto Rico (Aurora de Albornoz...), Moçambique (Joaquim Montezuma de Carvalho), Tchecoeslováquia (Zdnek Hampl), México (Alejandro Finisterre, Ramón Lorenzo...) e, é claro, na Galiza (Ramón Otero Pedrayo, Aquilino Iglesia Alvariño, Vicente Risco, Francisco Fernández del Riego, Ánxel Fole, Xosé Luís Franco Grande, Arcadio López Casanova, Manuel Rabanal, Salvador García Bodaño, Fernando Mon, Ramón Lorenzo, Xosé Luís Méndez Ferrín, Xosé Maria Alvarez Cáccamo, Carlos Durão, Xosé Estévez, Célia Díaz Núñez, José Luís Fontenla, Henrique Dacosta, X. M. Maceira Fernández, Xosé Maria Dobarro, Armando Requeixo, Teresa López Fernández, Pilar Castro, Martinho Montero Santalha, Gladstone Chaves de Melo, Luís Gonçales Blasco, Maria do Carmo Henríquez Salido...)[1]. Nesses contributos salienta-se o enorme valor e interesse destes dois trabalhos literários.
Por isso é para mim tão gratificante esta iniciativa da AGAL. Pois com esta nova edição vou ver aparecer na amada Terra natal –única Pátria do meu espírito— esta já minha pálida Lua e este meu já cinzento Rio, desconhecidos para o público leitor das gerações mais novas, trajados agora com o vestido portugalego do resto da minha obra lírica. Isto é com a ‘koiné’ do mundo universal da Lusofonia, à qual –seja qual fôr o destino que Deus venha providenciar para a Galiza—eu, pela LÍNGUA –que é o crisol da ALMA – pertenço.
(Ernesto Guerra da Cal, texto prefacial à edição da AGAL de Lua de Além-Mar e Rio de Sonho e Tempo, p. 52)
Em Agosto de 1965, o Jornal de Letras do Rio de Janeiro, publicação central na altura no Brasil para a poesia, homenageou Da Cal como poeta, publicando dois poemas dele, acompanhados de versão para o cânone ortográfico brasileiro realizada pelo eminente poeta e académico Manuel Bandeira. Aquela homenagem era salientada na capa da prestigiosa revista literária, e ocupava toda a página 7. Aí, Eduardo Portella, na altura nome já cimeiro da crítica brasileira (depois Ministro do Governo do Brasil e alto cargo da UNESCO, e hoje reputado acadêmico, ensaista e pedagogo de projeção internacional; de estirpe galega) ocupou-se da produção científica e literária de Ernesto da Cal. Nesse magnífico estudo de 1965, em que valoriza conjuntamente Lua de Além-Mar e Rio de Sonho e Tempo, afirma Eduardo Portella:
Ernesto Guerra da Cal já não precisa ser apresentado no Brasil. Sua lição de crítico, sua voz de poeta, seu calor humano, fizeram dèle uma extraordinária legenda que preservamos conosco, e onde se mistura, numa estranha e perfeita combinação, o mestre que seguimos e o irmão que amamos. Ernesto Guerra da Cal é professor do Queens College, de City University of New York.
Esta condição super-metropolitana não apagou nele o cidadão da sua província natal, o galego impedernido que carregou consigo as rias claras e os campos verdes da sua Galiza, que se manteve fiel à lua de além mar e construiu um imenso rio de sonho e de tempo. A êle, “navegador e troveiro”, parente próximo de Don Paio Gomes Charinho, e de todos os construtores da tradição galaico-portuguêsa, reverenciamos aqui, agora e sempre. [...]
Lua de alén mar (1959) e Rio de Sonho e Tempo (1963) dilata o horizonte expressivo desse território comum e múltiplo da lírica luso-galego-brasileira. A arregimentação apropriada de recursos idiomáticos novos e velhos, o tratamento renovado dos nossos temas de sempre, a saudade, a mesma da sua Rosália de Castro, a angústia do tempo, o sortilégio do mar, fazem dêsse trovador antigo e moderno, navegador e astronauta, um património nosso que nos cabe preservar.
A reedição desses dois poemários pela AGAL, em 1991, inclui uma “Apresentação” da Professora Doutora Maria do Carmo Henríquez Salido, prestigiosa docente e pesquisadora da Universidade de Vigo, na altura presidenta da AGAL. Em texto prefacial a esse volume, justifica a sua publicação, afirmando Henríquez Salido (p. 13):
Se a grande Rosalia levantou umha bandeira numha época determinada da nossa Literatura, o Professor Ernesto Guerra da Cal, Membro de Honra da “Associaçom Galega da Língua” desde o momento da sua criaçom mais umha vez fazia agitar essa mesma bandeira em contra da inadequada situaçom da nossa escrita e da nossa língua. Só com a reintegraçom no ámbito cultural luso-brasileiro do galego é como se podia ultrapassar esse discurso provinciano e micro-regionalista.
NOTA A RODAPÉ
[1] A respeito da recepção dos dois livros, ver o estudo de Joel R. Gômez A trajectória de Ernesto Guerra da Cal nos campos científico e literário, Tese de Doutoramento orientada pelo Professor Doutor Elias Torres Feijó, e editada em 2009 pela Universidade de Santiago de Compostela (ISBN: 978-84-9887-257-6), sobretudo nas pp. 194 e seguintes.
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