A música 'brasilega' conquista o coraçom verde de Compostela
Sexta, 03 Junho 2011 07:59

Fred e Ugia, umha só língua une a música 'brasileta' de Niterói a Foz
Maria Espantoso - Ugia Pedreira e Fred Martins apresentárom ontem em Compostela o seu primeiro disco juntos, Acrobata. Um trabalho no qual se misturam dous dos mais emblemáticos sabores da nossa língua. Um, o da terra que viu nascer o idioma. Outro, o do país que concentra maior número de falantes.
No Brasil, o acrobata é o carrám, umha ave ártica que na sua viagem migratória a grande distância cara ao sul fai umha paragem para comer nas costas galegas. Também o acrobata é umha ave que mora na regiom sul do Estado da Bahia e que está em perigo de extinçom. É por isso que em palavras de Ugia e Fred, este disco «dispom de asas como estas aves para que cada umha das canções disponham da autonomia precisa para voarem ceives».
O concerto decorreu no coraçom verde de Compostela, isto é, no parque de Belvis. Enquanto nom chegava a hora, as pessoas interessadas pudérom também desfrutar de um roteiro ornitológico guiado polo biólogo João Aveledo. Como comentaria depois Ugia, «nom lográrom encontrar nengum carrám», mas a experiência foi «grandiosa», resumia umha das participantes.
Ugia, Fred e Pedro, e a natureza entrando nas instalações do CIAC
Já no que diz respeito da atuaçom musical, nom fôrom poucas as vezes em que a focega e o niteroiense reivindicárom a música «brasilega». E nom fôrom poucas as vezes em que ambos vindicárom a língua comum que une todas as peças do disco, bem pola via das declarações, bem pola via dos factos. Ouvim dizer a alguém no público «nom há dúvida, falamos a mesma língua». Também escuitei que «Ramón Lorenzo nom poderia desfrutar nunca de um espetáculo como este... ele fala melhor o castelhano».
Entre cançom e cançom explicárom como se gestou o projeto, praticamente no momento em que se conhecêrom, ano 2008, em terras do Brasil.
O ambiente, entre amigos, de camaradagem, quase familiar, levou o público a se implicar a fundo, sendo quase o quarto componente do espetáculo —com permissom de Ugia, Fred e o Pedro Pascual, quem acompanhou com o acordeom várias das peças—. O êxtase obrigou-nos a cantarem umha «última» cançom. Umha «última» à qual seguiu outra «última», e outra, e outra... no meio de sucessivas ovações. Mas, como todo o bom, havia que pôr um remate, mesmo que fosse simbólico, porque haverá continuaçom.
Ugia tocando e cantando umha das «últimas» peças
Efetivamente, pois o de ontem em Belvis foi o concerto inaugural de umha turnê que os levará de Compostela ao Brasil, passando por boa parte da geografia galego-portuguesa: Corunha, Mondonhedo, Marim, Ferrol, Monção... O Centro de Interpretaçom Ambiental de Compostela (CIAC), espaço físico no meio do parque, completou lotaçom. Contudo, as pessoas residentes na capital do País ou nas proximidades tenhem hoje umha nova possibilidade, pois Ugia e Fred volvem dar este serão um novo concerto.
Um guiso marinheiro bem cozinhado
Por Jéssica Beiroa (*)
Umha caldeirada cheia de bom gosto e melhor fazer. Acrobata é e foi na noite compostelana de 2 de junho um presente para os sentidos. Ugia Pedreira e Fred Martins valêrom-se de nossos olhos e ouvidos para nos levarem a dar voltas ao Brasil, a Cuba, à Galiza... A um universo de evocadoras imagens sonoras com sabor a sal e a amor.
Umha estética impecável e colaboraçons de luxo como a do Pedro Pascual. E um nível artístico e humano que desbordou.
Vozes diretas, contundentes e ao tempo com umha candura extraordinária. E surpresas pequenas e temas dedicados, e vontades e maçãs «por se a fame apertar»...
Podiam-se sentir a música, as ideias, as pessoas e até pisar a areia ou sentir a água baixo os pés.
Um sentimento, como bem cantou o Fred Martins na peça que dedicou à Ugia Pedreira, de doce-amargo ao os escuitar falar de saudades com um interpretar tam lindo.
Ao preguntar à Ugia depois de rematar a atuaçom —num intento de resumir as impressões causadas—, «Como é que nos deste tanto?» ela respondeu, «Porque o temos». E a magia volveu, através do silêncio cúmplice, cair sobre o acolhedor lugar de Belvis, cheio de espetadoras e espetadores enchidos pola boa música e as melhores palavras.
Foi um concerto, sim, mas também um meio de transmissom de umha cultura que é a nossa, a da lusofonia.
Bonito e necessário Acrobata.
(*) Jornalista de profissom, dedica boa parte do seu tempo a aquilo de que mais gosta, a música tradicional galega. Antiga integrante da banda de gaitas 'Estivada' de Calo e do grupo de pandeireta 'Riscadela', atualmente forma parte de Arreixeira e percorre a comarca de Compostela dando aulas cada tarde e até a noitinha com a sua pandeireta e o seu gorjear (no bom senso da palavra).